Minha reflexão dentro da cadeia
"Em nosso peito bate uma saudade tão forte que até parece um ataque cardíaco que nos faz cair no chão da cela chorando e sofrendo"As pessoas dizem que a cadeia é o inferno e que a cadeia é do diabo. Mas eu mesmo aqui dentro tenho, às vezes, outros pensamentos. Quem sabe se, às vezes, a cadeia não é de Deus. Pensando bem, eu aqui estou longe dos perigos do mundão, livre das pessoas que nos olham torto, que nos julgam.
Aqui dentro ninguém pode julgar ninguém, pois todos somos pecadores, sofredores, presos. Para a maioria do povo somos bichos, assassinos e presos que não amam, etc. Mal sabem eles que nós somos uma das pessoas mais fortes do mundo, superadores de grandes sofrimentos. Muitos chegam aqui e quando dão por si já tiraram suas próprias vidas, outros ficam loucos, outros adoecem. Nós somos sobreviventes e ficamos aqui vendo a nossa vida passar diante dos nossos olhos, todos os erros, todas as falhas, perdendo em nossas famílias coisas muito importantes. E surgem grandes arrependimentos.
O respeito aqui é muito maior do que em qualquer outro lugar. Respeitar o lugar, o espaço, o vício do outros, as opiniões dos outros, tudo isso é essencial para poder viver aqui. Todos aqui dependem uns dos outros, aqui nós vivemos alguma coisa em comum, a saudade. Aqui temos um só objetivo para viver, a nossa liberdade. Estamos esperando um só julgamento, que Deus nos livre do castigo que ele nos deu, para que na vida aprendamos alguma coisa que ainda não aprendemos. Aqui é preciso ser forte o bastante para quando olharmos lá fora, não ter nada para nos impedir de ver melhor.
Em nosso peito bate uma saudade tão forte que até parece um ataque cardíaco que nos faz cair no chão da cela chorando e sofrendo. Temos que nos virar de qualquer jeito, por isso usamos a nossa inteligência e coragem, a força de vontade e a lei da sobrevivência e assim vamos conseguindo tudo que precisamos. Aqui tem muitas mentes, umas mais sábias que as outras, umas mais maldosas. Tem pessoas que estão aqui há anos e outras que ainda terão que ficar muitos anos e que ainda não aprenderam a viver, falam demais, vêem demais e acaba mais um sangue derramado, mais uma cova aberta, mais uma mãe que chora.
Estamos aqui vivos, estamos em uma escola, mas uma escola diferente, escola de sobrevivência. A ansiedade bate no peito toda vez que se escuta a chave do cadeado e a grade se abrindo. Fecham-se os olhos e se imagina saindo na galeria. E quando chega o agente, você se pergunta: será que sou eu?
Tamires de Assis Ferreira
Fonte: Jornal Recomeço - Edição 152 - Março/2009
Este texto é um retrato fiel das prisões, feito por uma jovem, mas bem jovem ainda.
Que teve sua juventude roubada pela crueldade da violencia.
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